No mês de agosto de 2020 aconteceu nas redes sociais da ISLA Sementes uma sequência de lives abordando temas inovadores relacionados a horticultura brasileira. Em uma dessas conversas, Diana Werner (presidente da ISLA Sementes) conversou com Alex Lee, diretor comercial na Rio Bonito Orgânicos, empresa que atua a mais de 11 anos no mercado de produção orgânica de alimentos sobre horticultura de alto impacto e produção orgânica de hortaliças.
QUEM É A RIO BONITO?
A Rio Bonito Orgânicos é uma produtora e distribuidora de hortaliças orgânicas que está presente em 16 estados brasileiros, conta com 78 horticultores distribuídos em diferentes regiões do país e opera com mais de 400 pontos de venda, estrutura que a torna responsável por oferecer hortaliças orgânicas de forma ampla e sistêmica para muita gente. Nessa conversa, Alex nos contou um pouco sobre os principais desafios encontrados na missão de profissionalizar e exponenciar o alcance das hortaliças orgânicas no Brasil, o novo cenário em que nos encontramos e como as circunstâncias alteraram o mercado de orgânicos. Também foi conversado sobre o futuro desse mercado e o que falta para a consolidação de uma produção orgânica e brasileira de hortaliças que atinja um grande parcela da população.
Separamos algumas falas importantes e perguntas realizadas durante a live. Confira abaixo na matéria:
QUAL O MAIOR DESAFIO EM PRODUZIR HORTALIÇAS ORGÂNICAS EM LARGA ESCALA?
Alex Lee: “O grande problema do Brasil é a produtividade. Precisamos atingir o nível de produtividade. Esse é o maior desafio dos orgânicos. Ainda falta um caminho muito longo para competir com as hortaliças tradicionais. Para conseguir produtividade é preciso conhecimento, que está na mão de poucos. Muitas vezes o produtor tem muita resistência, poucos recursos ou falta conhecimento para aplicar o que foi aprendido com a assistência técnica.”
“Para conseguir produtividade é preciso conhecimento, que está na mão de poucos.”
Alex Lee, Rio Bonito Orgânicos
COMO SE DÁ A RASTREABILIDADE NA PRODUÇÃO DE ORGÂNICOS?
Alex Lee: “A questão da rastreabilidade dos orgânicos está relativamente bem resolvida. Sem rastreabilidade, não tem como provar que são orgânicos. Neste quesito, o orgânico está a frente do convencional. É um quesito obrigatório, todos vão ter que chegar lá. Os orgânicos estão de parabéns nesse quesito.”
A RIO BONITO CONTA COM DEZENAS DE PRODUTORES EM REGIÕES DISTINTAS. COMO OPERACIONALIZAR A RASTREABILIDADE DENTRO DESSE CONTEXTO?
Alex Lee: “Um caderno de campo bem feito com os produtores para entregar o que se espera de um produto rastreado. Um sistema operacional que já te dê todas as informações: dia de semeio, dia de transplante, dia de colheita, dia de terminar, peso estimado por semana, por colheita. O sistema já amarra muito bem quase todos os passos. Na hora de emitir a nota fiscal, ele relaciona isso com o sistema e está fechada a rastreabilidade, sem necessidade de correr atrás com esse sistema operacional.”
QUAL A SUA VISÃO SOBRE AS EMBALAGENS E PERSPECTIVAS PARA O FUTURO?
Alex Lee: “É indiscutível que, no mundo, a gente está se encaminhando para um cenário livre de embalagens ou a utilização de embalagens sustentáveis. Sustentabilidade é cuidar do nosso planeta. Não queremos que os nossos trisanetos encontrem as embalagens que estamos utilizando hoje no meio ambiente. Temos que ir para as embalagens sustentáveis ou livre de embalagens. A Rio Bonito mudou boa parte das embalagens para biodegradáveis recentemente, a repercussão foi ótima, o varejo viu com bons olhos. Eu acho que falta no consumidor um pouco mais de exigência nesse sentido, o consumidor precisa exigir mais.”
COMO O HORTICULTOR PODE SE INFORMAR SOBRE OS PRODUTOS QUE PODEM SER UTILIZADOS NO CULTIVO ORGÂNICO?
Alex Lee: “Deveria ter uma base de dados única onde todo mundo pudesse acessar todas as informações sobre os produtos permitidos no cultivo orgânico, a consulta dos produtos permitidos. Os produtores encontram muita dificuldade.
No nosso plano de manejo temos mais de 300 produtos listados. Garanto para vocês que são poucos produtores no Brasil que tem consciência que existem mais de 300 produtos listados para agricultura orgânica. O produtor pequeno tem muita dificuldade, não tem acesso à informação, ao produto, não tem conhecimento técnico para aplicar, existe uma carência muito grande. Se tivesse uma listagem única, seria muito útil. A Embrapa faz um esforço muito grande para ajudar o pequeno produtor, existe uma lista de produtos feita por eles que é bem completa, ajuda muito.
A certificadora não pode recomendar nada. É proibido. Ela só está lá para auditar. Mudar esse paradigma seria uma ótima ideia, já que as certificadoras conhecem muito. A agricultura orgânica ainda é cheia de detalhes que precisam ser resolvidos.”
Clique aqui para acessar uma relação de produtos fitossanitários aprovados para uso na agricultura orgânica. Fonte: www.agroecologia.gov.br
COMO FUNCIONA A ANÁLISE DE RESÍDUOS?
Alex Lee: “Todas as semanas são feitas análises de resíduos. 0,3 microgramas é o máximo aprovado. É muito importante o produtor consultar o órgão auditor para verificar os produtos possíveis de serem utilizados. Mesmo com produtos que tenham selo, devemos entender a aplicabilidade do selo, entender como o produto deve ser utilizado. Se for aplicado de forma errada, ele entra no período de conversão, que pode durar até 1 ano. Então é sempre muito importante entrar em contato com a certificadora. Tem que ter certeza da aplicabilidade do produto dentro do sistema orgânico.
COMO EVITAR A CONTAMINAÇÃO CRUZADA?
Alex Lee: “Acontece com frequência. Super importante fazer barreiras de vento, manter afastamento e ainda sim fazer análise de resíduo. A contaminação cruzada pode acontecer em vários momentos. Um exemplo é no transporte. Quantas pessoas de orgânicos verdadeiramente transportam seus produtos separadamente de convencionais? Eu te garanto que a grande maioria transporta com convencional, pois não tem volume. Para diminuir esses riscos, é possível ensacar. No caso da Rio Bonito, como temos um porte maior, conseguimos trazer todas as cargas em caminhões nossos.”
QUAL O MAIOR DESAFIO DA PRODUÇÃO ORGÂNICA?
Alex Lee: “A produtividade ainda é o maior desafio em relação ao cultivo tradicional, que temos que superar. Para isso, é muito importante que o viveiro traga uma muda excepcional. Ela precisa estar no ambiente correto para climatização. O transplante precisa ser na umidade correta para que a planta não sofra. O manejo correto da adubação, sol, luz, ventilação e pulverização é muito importante para conseguir alta produtividade. Não é por acaso que se consegue multiplicar a produtividade de uma área. É necessário fazer todo o manejo correto desde o começo. Isso é um processo, os produtores vão melhorando e aprimorando as técnicas. É assim que vamos conseguir que os orgânicos tenham um preço melhor.
A cultura certa para o lugar certo também é muito importante na produção orgânica. Evitar produzir algo que é difícil para aquele clima é essencial”
“É necessário fazer todo o manejo correto desde o começo. Isso é um processo, os produtores vão melhorando e aprimorando as técnicas. É assim que vamos conseguir que os orgânicos tenham um preço melhor.”
Alex Lee, Rio Bonito Orgânico
AS HORTALIÇAS ORGÂNICAS AINDA SÃO UM PRODUTO DE NICHO?
Alex Lee: “Sim. Na pandemia isso cresceu bastante. O produtor local passou a entregar na casa das pessoas, um mercado difícil de ser acessado. Começaram a entregar um produto diferenciado na casa das pessoas. Isso me deixa muito feliz, isso estimula a agricultura orgânica a crescer. Aquele produtor que antes não tinha chance, agora tem”.
É VIÁVEL PARA RESTAURANTES CONTAR COM PRODUTORES ORGÂNICOS?
Alex Lee: “A maioria dos restaurantes valorizam imensamente o trabalho do pequeno produtor. Para eles é muito importante a possibilidade do pequeno produtor garantir sua sobrevivência e sua continuidade. O produto orgânico entregue diretamente pelo produtor pode ter preços muito próximos aos produtos convencionais, pois não há intermediários. Essa aproximação pode ajudar a dar mais acesso aos produtos diferenciados. O pequeno produtor deve procurar os restaurantes, no entanto ele precisa resolver a questão da ruptura. Os restaurantes não conseguem repor um cardápio de uma hora para outra. É preciso um planejamento muito bem feito. Sentar com o cliente e falar sobre o cardápio com o chef e o restaurante para juntos formar um cardápio adaptado, planejado e sazonal. Para ter o máximo da hortaliça é importante ter a noção de sazonalidade”.
OS PRODUTOS DIFERENCIADOS TEM SAÍDA NA PRODUÇÃO ORGÂNICA?
Alex Lee: “O brasileiro está muito ávido por novidades. Ele quer experimentar, ele quer coisas diferentes. No entanto, ele não sabe usar. É muito importante esse trabalho que a isla faz de saber preparar. A degustação em pontos de venda ajudam a ensinar a preparar e alavancam as vendas. Fizemos isso com a abóbora pérola negra e foi um caso de sucesso. Hoje na Rio Bonito já contamos com mais de 70 itens diferenciados.”
QUAL DICA VOCÊ DARIA PARA QUEM ESTÁ COMEÇANDO A PRODUZIR ORGÂNICOS?
Alex Lee: “Agricultura orgânica não é fácil. Todo mundo fala que é uma coisa simples, mas não é. É difícil produzir mesmo. Tem que buscar assistência técnica, tem que buscar gente que entende de produção, tem que buscar novas tecnologias que existem no mercado e recursos. Quando você for começar, descubra para quem você vai vender. A coisa mais frustrante é você fazer o produto e não ter venda. Vai buscar qual vai ser o canal que você quer entregar. Vai ser um supermercado? Vai ser uma feira? Vai ser porta a porta? Vai ser um resataurante? Não importa qual seja, vá em busca de um comprador antes de plantar. Além disso, busque uma assessoria técnica, profissionais aptos a auxiliar. No final, busque sempre produtividade na área que você já tem ao invés de expandir.”
Saiba mais sobre a Rio Bonito e o trabalho do Alex Lee acessando o site: https://www.fazendariobonito.com/
Para saber mais sobre produção orgânica de hortaliças, acesse os conteúdos da Embrapa Hortaliças: https://www.embrapa.br/en/agrobiologia/pesquisa-e-desenvolvimento/agroecologia-e-producao-organica